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domingo, 1 de dezembro de 2013

Português musicalmente falado...

Nos últimos anos temos assistido a uma incapacidade por parte do grande publico em valorizar a música cantada em português. Ao contrario do que se podia constatar no panorama musical nacional nos anos 80, em que a esmagadora maioria dos artistas ainda prestigiava a sua língua materna, o século XXI abriu-nos os horizontes ao que se fazia lá fora e enquanto que escancarámos a porta ao que vem de fora, vamos fechando as janelas do que se faz por cá.
Ok, tenho de concordar que nos anos 80 ainda se traziam os tempos duros da ditadura bem frescos e talvez isso ainda assombrasse um pouco a ousadia artística, ou talvez não. Gosto de acreditar que, o que se fazia na altura era mais genuíno. Que fique claro que não tenho nada contra músicos portugueses preferirem expressar-se artisticamente em outras línguas ( nomeadamente o inglês), até porque esta quase "guerra" moralista entre ser ou não legitimo cantar-se numa língua que não a nossa língua mãe, já passou por baixo de muitas pontes e não se chegou a conclusão nenhuma. Liberdade de expressão inclui liberdade de escolha e a musicalidade de cada um é escolha de cada um, quer se goste mais ou menos. talvez se cante mais em inglês porque existe um sonho, uma necessidade de voar rumo a outras plateias. Entendo. Mas se até os japoneses ouviram Amália cantar o fado mais genuinamente lusitano e apreciaram, mesmo sem terem entendido qualquer palavra... a questão continua. Eis que o que talvez muita gente não entenda é que a música enquanto arte, vive em muito mais do que palavras. Ela sente-se mais do que se entende...e embora seja possível ama-la sem entende-la é deveras difícil ama-la sem senti-la.
Outra questão é, se vão optar por outra língua para expressar a sua arte, que não o façam levianamente só porque sim. Usem-na bem, pronunciem-na bem, tratem dela como tratariam da língua que vos guiou nas primeira palavras. Creio que onde muitos se perdem, não raras vezes, é na tentativa de serem entendidos pelo mundo inteiro e nem meio mundo os entende de tão mal se pronunciarem. Haja calma nessa hora. Se existe um problema com os consumidores portugueses, que desacreditam a própria língua musicalmente, nós enquanto consumidores podemos dizer o mesmo em relação aos artistas e aos seus editores. Também eles parecem ter desacreditado a nossa cultura.
 Pois pasmem, o que existe de mais valioso num povo é a sua cultura. Se calhar estava na hora de voltarmos a dar valor às origens. Criar raízes intemporais mais profundas que a ganancia de vender além fronteiras. Apostar no que é a nossa verdadeira herança: a cultura.  E não, não estou a dizer para ouvirem música popular, pimba, de folclore ou qualquer outro rotulo que lhe queiram impor, estou apenas a levantar algumas questões que as vezes me atormentam enquanto melómana e enquanto patriota. Claro que consumo música estrangeira ( mais que muita até) mas também gosto de cultivar a semente portuguesa naquilo que me é possível ( ok agora vão perguntar porque escolhi um nome estrangeiro para o blog).
 Há coisas muito boas feitas por cá, e muito boas vozes que ainda se atrevem a prestigiar a língua de Camões e de todos nós. Querem criticar, dizer que não presta? Digam, estão no vosso pleno direito, mas não o façam sem darem a chance de escutar. Há sempre uma melodia que se encaixa, um presente aos nossos ouvidos. E tudo o que ela precisa para germinar é de uma oportunidade.
Para rematar, deixo aqui como exemplo a minha descoberta auditiva desta manha, bastante prazerosa devo dizer, um projecto sem preconceitos, repleto de referencias da nossa musicalidade que vários artistas vestiram com a sua voz e a sua alma. De ouvir e sonhar por mais.

http://www.youtube.com/watch?v=WD33HQg8iX8&list=PLw3jJzWsyjTdyuy0wyRG50GQafl_6QzBx


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

J.K. Rowling e " Uma morte súbita"

Quem não conhece J.K.Rowling que atire a primeira pedra... ok, sem dramas, podem não conhecer a mencionada autora mas certamente que a sua obra prima, a sua epopeia juvenil literária, não vos terá deixado indiferentes ( ou então não habitam este planeta). Claro que falo de Harry Potter, o aprendiz de feiticeiro mais famoso do planeta e quiçá arredores, mas esta personagem dispensa apresentações. J.K. Rowling habituou-nos a uma escrita fácil de se gostar. Embora as aventuras do pequeno feiticeiro tenham sido escritas a pensar num público mais jovem, a forma como a trama nos é apresentada é deveras bem escrita e muito bem estruturada. Personagens complexos, segredos bem guardados até ao finalzinho de cada aventura e muitas peripécias em cada capitulo fazem da saga, a colecção de aventura mais vendida de todos os tempos. Ok, há muito quem não goste e questione a narrativa da autora, assim como também existiam os fãs que passavam a noite na portas das livrarias esperando ser os primeiros a tocar a obra ( e devorá-la literalmente).
Então, eis que depois de tanto questionarem as capacidades da autora, ela decide afirmar-se nisto das escritas mostrando aos mais cépticos que veio para ficar. Uma Morte Súbita ou  Casual Vacancy ( no titulo original) é o primeiro livro da autora para um publico mais adulto. E o que há de novo nisso? - perguntam vocês. Nada. E é exactamente isso que é incrivelmente bom. Não é a historia em si que trás algo de diferente ao panorama da literatura, mas sim a maneira como ela é contada.
O jogo constante de diferentes pontos de vista da mesma história encarada e sentida por diferentes personagens, o "estalo na cara" a uma sociedade local cheia de preconceitos e julgamentos morais, a trama complexa a que nos habituou. O jogo de cintura com que a trama nos enreda até ao desenlace final é surpreendente, quase tomamos as dores dos personagens, e em cada um deles vemos um pouco de nós. Aquela linha ténue entre a ficção e a realidade, em que ambas se misturam e descobrimos que Pagford podia ser ali ao virar da esquina, afinal nada inspira melhor a ficção do que a própria realidade.
Este livro é a prova de que uma história aparentemente simples quando bem trabalhada pode revelar-se surpreendente. E surpreendente é decididamente a palavra certa, pois quando se julga que a história vai seguir para a esquerda, ela decide desmistificar algum segredo e enredar-nos novamente. Desfecho inesperado para algumas personagens, capacidades de reacção inesperadas em outras, porque no final das contas ninguém tem tanto de santo, nem tanto de vilão.
 Se eu podia fazer "spoiler"? Podia, mas não quero influenciar a vossa opinião sobre a obra em causa. Leiam e digam de vossa justiça... eu apenas digo, J.K.Rowling amadureceu literalmente junto com os seus leitores que num dia iam para a escola esperando encontrar Hogwarts e no meio caminho descobrem a pequena cidade de Pagford.

De volta das letras, outra vez...

E é possível  deixar de comentar as pilhas de coisas e de livros que se lêem por ai?
Sim, as coisas também se lêem. Algumas histórias são sussurradas, assim de mansinho por algum livro deixado aberto por descuido, ou nalgum olhar perdido propositadamente.
 Quantas histórias guardamos dentro de nós? Tantas quantas somos capazes de albergar no peito. E quantas histórias protagonizamos? Tantas quantas nos florescem nas pele. E se todas fossem palavras dançando nas páginas de um livro? Talvez arranjassem morada...no coração ávido de um leitor.